terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Com Medellín, Deus passou pela América Latina. Com quem passa agora? Jon Sobrino

Reflexão para a Quaresma 2012
Os dez anos de Medellín (1968) a Puebla (1979) foram únicos na época moderna da Igreja Católica na América Latina, Depois, começou um declive ao que Aparecida (2007) quis colocar freio, apesar de que ainda temos muito que fazer.
Ao fazer essa avaliação, não nos fixamos na igreja tal como a analisam os sociólogos, mas nos fixamos na "passagem de Deus". Sem dúvida, é mais difícil calibrar; porém, toca a dimensão mais profunda da Igreja e ao serviço de que ela deve estar. Definitivamente, qual a contribuição que ela dá aos seres humanos e ao mundo como um todo. E, obviamente, temos que perguntar-nos "que Deus" é esse que passa pela história em um momento dado.
Medellín
Foi um salto qualitativo. Os pobres irromperam e, neles, Deus irrompeu. Foi um fato fundante que penetrou na fé de muitos e configurou a Igreja.
Surpreendentemente, para a assembleia de bispos, a prioridade não foi da igreja em si mesma; foi do mundo dos pobres e vítimas; isto é, da criação de Deus. Suas primeiras palavras proclamam a realidade do continente: "uma pobreza massiva produto da injustiça". Os bispos atuaram, antes de tudo, como seres humanos e deixaram falar a realidade que clamava aos céus. São os clamores que Deus escutou no Êxodo; o fizeram sair de si mesmo e, decididamente, entrou na história. Da mesma forma, com Medellín, Deus entrou na história latino-americana.
A partir dessa irrupção dos pobres e de Deus neles, Medellín pensou o que é ser Igreja, qual é sua identidade e missão fundamental e qual deve ser seu modo de estar em um mundo de pobres. A resposta foi "uma igreja dos pobres", semelhante à ilusão que tiveram João XXIII e o cardeal Lercaro. No Concílio, não prosperou; em Medellín, sim. A Igreja sentiu compaixão pelos oprimidos e decidiu trabalhar por sua libertação. Por muitos, com maior ou menor consciência explícita, foi acolhida como bênção. Por outros, foi percebida, com razão, como grave perigo.
Logo o poder reagiu. Em 1968, Nelson Rockfeller escreveu um relatório sobre o que estava acontecendo, e essa Igreja, nova e perigosa, tinha que ser debilitada e freada; o mesmo aconteceu no começo da administração Reagan. Oligarquias com o capital, com exércitos, esquadrões da morte, desencadearam uma perseguição contra a Igreja, desconhecida na história da América Latina. A perseguição reiterada deixou às claras a novidade e o evangélico que estava acontecendo: A Igreja de Medellín estava com o povo pobre e perseguido e teve a sua mesma sorte. Milhares foram assassinados, entre eles meia dezena de bispos, dezenas de sacerdotes, religiosos e religiosas, e uma multidão de leigos, mulheres e homens. Com limitações, erros e pecados, era uma Igreja muito mais casta do que meretriz; muito mais evangélica do que mundana.
No interior da Igreja Católica, Paulo VI propiciou e animou essa nova Igreja; porém, altas personalidades da Cúria Romana e de outras cúrias locais a desqualificaram, trataram mal e injustamente a seus representantes, também a bispos e desenharam uma igreja alternativa, diferente e contrária, mais devocional, intimista, de movimentos, submissos a defensores da hierarquia. E o que teria que ser evitado era que a Igreja voltasse a entrar em conflito com os poderosos. A igreja popular, nascida ao redor de Medellín, crente e lúcida, de comunidades de base, que vivia a pobreza do continente, sofreu a dupla perseguição do mundo opressor e, com alguma frequência, da própria igreja.
Uma Igreja assim foi testemunha e seguidora de Jesus de Nazaré. Encarnada, defensora e companheira dos pobres; carregava a cruz e, com frequência, nela morria. Anunciou a Boa Notícia, como Jesus na Sinagoga de Nazaré. Teve seus "doze apóstolos", os Padres da igreja latino-americana, com Dom Helder Camara, um dos pioneiros; com Enrique Angelelli, Dom Sergio Méndez Arceo, Leonidas Proaño, Dom Romero, pastor e mártir do continente e outros. Chegou a ser ekklesia, na qual mulheres e homens, religiosas e leigos, latino-americanos e estrangeiros chegaram a formar corpo eclesial, uma grnade comunidade de vida e missão. Entre os de casa e os de longe, gerou-se uma solidariedade nunca vista. Cresceu a esperança e o gozo. E do amor dos mártires nasceu uma brisa de ressurreição, alheia a toda alienação, que voltava a remeter à história para nela viver como ressuscitados.
Nessa Igreja, soprava o Espírito, o espírito de Jesus e o espírito dos pobres. Esse espírito inspirava oração, liturgia, música, arte. E também inspirava homilias proféticas, cartas pastorais lúcidas, textos teológicos de casa; não textos simplesmente importados que não haviam passado pelo crisol de Medellín.
No centro de tudo estava o evangelho de Jesus. Lucas 4,16: "Eu vim para anunciar a boa notícia aos pobres, para libertar os cativos". Mateus 25,36-41: "Tive fome e me deram de comer". João 15,13: "Ninguém tem mais amor do que o que dá a vida pelos irmãos". E Jesus de Nazaré, o crucificado ressuscitado, Atos dos Apóstolos, 2,23: "A quem vocês mataram, Deus devolveu à vida".
E agora?
Pesquisas, estudos sociológicos e antropológicos, econômicos e políticos oferecem dados e explicações sobre a Igreja Católica e outras igrejas cristãs. Nos dizem se subimos ou baixamos em número e em fluxo na sociedade. A partir dessa perspectiva, nada tenho que acrescentar. E estritamente falando, tampouco é minha maior preocupação qual será o futuro do que chamamos "Igreja", apesar de que nela tenho vivido e vivo, e me acostumei a pertencer à família.
O que me interessa e alegra é que "Deus passe por esse mundo". E a razão é simples. O mundo está "gravemente enfermo", dizia Ellacuría, "enfermo de morte", diz Jean Ziegler. Isto é, necessita de salvação e cura. Por isso, como crente e como ser humano, desejo que "Deus passe por esse mundo", pois essa passagem sempre traz salvação às pessoas e ao mundo em seu conjunto. Tivemos a sorte de sentir essa passagem de Deus com Medellín, com Dom Romero, com muitas comunidades populares. Com muitas pessoas boas, simples, em sua maioria. Com uma plêiade de mártires. E também, apesar de que isso só se pode sentir "em um difícil ato de fé", como dizia Ellacuría ao explicar a salvação que traz o servo sofredor de Isaías, com o povo crucificado.
Como estamos hoje? Seria cometer um grave erro cair em simplismos sobre coisas tão serias. Seria injusto não ver o bom que, de muitas formas, existe nas igrejas. E seria arrogante não tentar descobri-lo, apesar de que, às vezes, se esconda por trás de uma capa que não remete com clareza a Jesus de Nazaré. De todo modo, a passagem de "Deus" sempre será mistério inescrutável, e somente com o máximo de respeito a todos os seres humanos podemos falar disso. Porém, com todas essas cautelas algo se pode dizer. Mencionaremos as realidades dos fieis e de suas comunidades; porém, temos em mente, sobretudo, às instâncias, altas em hierarquia, historicamente muito responsáveis pelo que acontece, e às que não se pode pedir contas com eficácia. Com simplicidade, dou minha visão pessoal.
De diversas formas, abunda o pentecostalismo, como forma de igreja distante dos problemas reais de vida e morte das maiorias, apesar de que traz ânimo e consolo aos pobres, o que não é desdenhar quando não têm onde apoiar-se para que sua vida tenha sentido - distinta é a situação em classes mais bem de vida. Prolifera um grande número de movimentos, dezenas deles, proliferam os meios de comunicação das igrejas, emissoras de rádio e TV, submissos em excesso a ideais e normas que provêm de cúrias, sem dar sensação de liberdade para que eles mesmos tomem em suas mãos o evangelho que anuncia a boa nova para os pobres, em forma de justiça, e sem suspeitar da necessidade de um estudo, reflexivo, minimamente científico, da Palavra de Deus, e, em geral, da teologia que o Vaticano II e Medellín propiciaram. Proliferam devoções de todo tipo, as de antes e as de agora. Jesus de Nazaré, o que passou fazendo o bem e morreu crucificado, é deixado de lado com facilidade em favor do menino Jesus, seja de Atocha, de Praga, o Deus menino, dito com grande respeito. Com facilidade se dilui o Jesus forte da Galileia, do Jordão; o profeta de denúncias ao redor do templo de Jerusalém em favor de devoções baseadas em aparições, com um transfundo sentimental e melífluo em excesso. Falando com simplicidade, a divina providência pode atrair mais do que o Pai de Jesus, o Filho que é Jesus de Nazaré, e o Espírito Santo, que é Senhor e doador de vida, e Pai dos pobres, como se canta no hino de Pentecostes.
Hoje, em seu conjunto, é difícil encontrar na Igreja a liberdade dos filhos e filhas de Deus, a liberdade ante o poder, que não por ser sagrado deixa de ser poder. Nota-se a excessivo servilismo e submissão a tudo o que seja hierarquia, o que chega a converter-se em medo paralisante. A partir das instâncias de poder eclesial, aponta o triunfalismo e o que chamo a pastoral da apoteose, multitudinária, midiática. Em muitos seminários, o discorrer e pensar são substituídos pelo memorizar. Nas reuniões do clero, pelo que sabemos, as perguntas, a discussão e o debate são substituídos pelo silêncio. As cartas pastorais dos anos 70 e 80 -verdadeiro orgulho das igrejas, que reverdecem de vez em quando, na Guatemala, por exemplo- são substituídas por breves mensagens, cheias de modos e comedidas, com argumentos tomados das últimas encíclicas do papa. O centro institucional não parece estar na América Latina, mas na distante Roma. Tudo isso está dito com respeito.
Como será a passagem de Deus pela América Latina e com quem passará está por ver-se, e, definitivamente, é coisa de Deus. Porém, é coisa nossa desejá-lo, trabalhar por isso e aprender a forma como se deu no passado, em Medellín.
Bom é saber e analisar os vai-e-vem dos fieis e o influxo das Igrejas na sociedade. Pelo que dizem os dados, em ambas as coisas, a Igreja Católica vai a menos. Porém, devemos ter presentes as raízes de cuja seiva tem vivido a passagem de Deus. E regá-la humildemente, com águas vivas.
Ainda estamos por ver o que acontecerá com nossa igreja e com todas as igrejas. Meu desejo é que, aconteça o que acontecer, seja para colocar-se a serviço da passagem de Deus por esse mundo, o Deus de Jesus, compassivo, profeta e crucificado. E o Deus doador de esperança.
Estas são as perguntas que sempre podemos fazer. Porém, quem sabe é bom fazê-las no começo da quaresma. Esse tempo nos exige resistência para caminhar rumo a Jerusalém. E nos oferece esperança de encontrar-nos com Jesus crucificado e ressuscitado.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Oração da Campanha da Fraternidade 2012

Senhor Deus de amor,
Pai de bondade,
Nós vos louvamos e agradecemmos
pelo dom da vida,
pelo amor com que cuidas de toda a criação.
Vosso Filho Jesus Cristo,
em sua misericórdia, assumiu a cruz dos enfermos
e de todos os sofredores,
sobre eles derramou a esperança de vida em plenitude
Enviai-nos, Senhor, o vosso Espírito.
Guiai a vossa Igreja, para que ela, pela conversão
se faça sempre mais solidária às dores e enfermidades do povo,
e que a saúde se difunda sobre a terra
Amém!

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Big Brother Brasil pode sair do ar

Versão piorada dos piores programas de TV do chamado primeiro mundo, o Big Brother Brasil pode sair do ar. A queda de audiência, desde a primeira edição do programa é preocupante para a Globo, apesar dos lucros. Em 2005, quando atingiu a melhor média no Ibope, o programa fechou com 47,5 pontos .  Na edição de 2011, a média foi de pouco mais de 27 pontos. O programa já perdeu quase a metade de seus espectadores.

Por que a Globo mantém o Programa no ar, apesar da queda de audiência?
Infelizmente, mesmo com público reduzido, o número de ligações para os ridículos “paredões” ainda rende muito dinheiro. Além disso, ainda há empresas insensíveis e desrespeitosas para com o povo brasileiro, que continuam patrocinando esse tipo de programação.

Como fazer para tirar esse tipo de programa do ar?
Uma medida judicial seria considerada pelas elites como censura. As mesmas elites não acusam de censura o veto das emissoras privadas ao Fórum Social Mundial, por exemplo.
O caminho é a pressão popular:
- Não assista!
- Fale com seus amigos para não assistir!
- Não telefone e convença seus amigos que, num sistema ruim como o do Brasil, ao congestionar uma rede telefônica (muitas ligações ao mesmo tempo), eles podem até impedir que uma pessoa necessitada receba socorro medico.
- Boicote os produtos dos patrocinadores do programa, pelo menos neste período (Guaraná Antártica, OMO, Fiat, Cerveja Devassa, Niely).
- Escreva para empresas as patrocinadoras alertando para o risco de grandes campanhas de boicote (hoje todo mundo teme a internet). A Avon já teve que declarar que não patrocina o Big Brother, mas que apenas veicula propagandas no horário. Hipocrisia! Pressione a Avon também!
- Pressione o Judiciário e o Legislativo. Não se esqueça, televisão é concessão pública, cabe à sociedade exigir programação de qualidade.

Um estupro ou muitos estupros?
Na edição de 2012 teve repercussão o possível caso de estupro, com o aval do apresentador Pedro Bial (diante das cenas, teria inicialmente dito que “o amor é lindo”). A omissão da Rede Globo é anterior ao fato, não só por manter o programa no ar, mas por manter o próprio apresentador, já denunciado por violência doméstica cometida contra sua própria companheira. Espera-se que um dia a televisão brasileira deixe de dar espaço para esse tipo de “profissional”.

Uma mulher vítima de estupro, o incentivo para que outros homens cometam a mesma violência, desrespeito à mulher e à sociedade como um todo. O problema de fundo: melhor do que estimular pessoas disputarem um ou dois milhões de reais, fazendo uso de todas as formas de violência, não seria melhor estimular a solidariedade e a partilha?

O caminho talvez esteja mesmo no boicote a qualquer tipo de programa de baixaria e na valorização da programação das TVs públicas.

Pense nisso. E aja!